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Sistemas operacionais são softwares de missão crítica, usados diariamente para gerenciar uma empresa. Toast é o sistema operacional para restaurantes, Mindbody, para academias, ServiceTitan, para serviços de campo e assim por diante. Como observamos em nosso post sobre como a tecnologia financeira gera ganho de escala para empresas verticais de SaaS, muitos desses negócios começam vendendo software como serviço e acrescentam serviços financeiros quando o cliente já está cativado. Sistemas operacionais podem gerar grande fidelidade; em muitos casos, são usados em todo o fluxo de recursos financeiros e têm uma grande variedade de pontos lógicos para upsell (venda de novas versões) e cross-sell (vendas cruzadas).
Mas por que os sistemas operacionais não são a regra em mais segmentos ou mesmo em todos? O que será necessário para trazer a cauda longa de certas categorias para o mundo on-line? O segredo pode estar em não vender software algum. Entram em cena os “sistemas operacionais freemium”.
Muito setores estabelecidos ainda enfrentam desafios para conseguir adesão a sistemas operacionais e é necessário um diferencial claro para romper essa barreira. Isso pode ocorrer por uma série de motivos: uma cauda longa de pequenas empresas pouco dispostas a pagar (ex.: agentes imobiliários), inércia para sair do papel (ex.: agentes de cargas) ou dificuldade de descartar e substituir sistemas operacionais bem estabelecidos (ex.: agentes de seguros comerciais). Oferecer um sistema operacional especializado gratuitamente pode representar um diferencial atraente, convencendo clientes que, de outra forma, não estariam dispostos a experimentar um novo produto. E se esse produto gratuito se tornar uma parte crítica do fluxo de trabalho diário, existem várias maneiras de monetizar gradualmente.
Acreditamos que esse diferencial pode assumir muitas formas diversas, mas uma que achamos fascinante hoje é o modelo freemium, que ajuda a facilitar o fluxo de caixa de empresas com restrição de capital de giro. Ele pode tomar formas diferente nos diversos segmentos da indústria. Por exemplo, se o volume de gastos é considerável e existe um responsável por eles (como pode ser o caso no setor de construção), um cartão de débito combinado com um software pode fazer sentido. Se houver comissões sobre vendas a serem pagas (como no setor imobiliário), um adiantamento pode fazer sentido. Se o volume de contas a receber é significativo, gerando problemas de capital de giro (como pode ser o caso no setor de fretes), empréstimos embutidos no sistema podem fazer mais sentido. Não é difícil de ver como ser o dono do sistema operacional de uma empresa daria a um possível credor melhor visibilidade da dinâmica do fluxo de caixa e das perspectivas futuras do negócio, criando um ambiente seguro para a concessão de empréstimos ao cliente, além de ofertas de serviços bancários, de despesas e de seguros.
Isto posto, o freemium não significa que essas empresas sejam apenas uma plataforma de distribuição de serviços financeiros. O envolvimento e a relevância do software como serviço específico para uma vertical continuam sendo importantes. O SaaS precisa gerar fidelidade por ser uma parte integrante e personalizada do fluxo de trabalho diário do usuário e repositório de dados críticos para seu trabalho (como, por exemplo, dados de clientes ou transações). Portanto, o software continua sendo valioso, apenas estamos reduzindo a barreira para sua adoção com a oferta gratuita. Às vezes também pode fazer sentido cobrar um valor mínimo apenas para gerar comprometimento (ou seja, você pagou, então vai usar) e evitar a seleção adversa. O ideal é que, com o tempo, a empresa possa cobrar por ofertas premium à medida que o cliente esteja mais cativado ou a empresa, mais sofisticada.
Estamos entusiasmados para saber mais sobre negócios com essas características se desenvolvendo em setores historicamente difíceis de entrar.
—Joe Schmidt, deal partner de tecnologia financeira da a16z e Seema Amble, partner de tecnologia financeira da a16z
Uma década atrás, havia a percepção de que as fintechs logo substituiriam todos os aspectos dos serviços bancários para o consumidor. Mas o que vimos acontecer é que os serviços financeiros ganharam enorme tração na parte da demanda do ecossistema (serviços bancários, pagamentos, experiência do cliente como um todo), com instituições financeiras tradicionais continuando a viabilizar a parte da oferta que depende majoritariamente do capital (depósitos, empréstimos).
Contudo, como poderá ser o futuro do setor bancário para o consumidor à medida que os papéis desempenhados por esse players evoluírem? Vemos sete áreas em todo o stack de serviços bancários para o consumidor com potencial de gerar algumas das maiores fintechs que ainda serão desenvolvidas.
—Anish Acharya, general partner de tecnologia financeira da a16z
Dívida médica nos Estados Unidos é um problema de proporções assustadoras. Metade dos americanos têm dívidas médicas hoje, em comparação com 46% em 2020, e entre dívidas com cobradores (US$ 140 bilhões), no cartão de crédito e em contas médicas não quitadas, os americanos devem um total de US$ 1 trilhão por serviços de saúde já utilizados. Para piorar a situação, os principais fatores que levam às dívidas médicas costumam ser procedimentos imprevisíveis e inevitáveis realizados para pessoas que simplesmente não têm como pagar por eles.
Uma vez endividado, as opções do paciente são limitadas. A maioria dos americanos (75%!) que têm dívidas médicas opta por tentar negociá-las. Isso muitas vezes requer vasculhar o Resumo de Benefícios e Cobertura, solicitar contas detalhadas ou pesquisar sobre qualificação para programas de assistência, e tudo isso pode ser desanimador e demorado. Embora 66% das pessoas que negociam façam isso por conta própria, 26% usam algum serviço terceirizado para auxiliá-las. Como esses serviços fazem todo o trabalho pesado mencionado acima, eles normalmente cobram de 30% a 40% da economia que conseguem descobrir.
Entretanto, a nova legislação sobre transparência na saúde pode dar mais poder a quem está negociando dívidas médicas. Esses fortes ventos favoráveis no ambiente regulatório podem apontar para um grande negócio a ser desenvolvido para ajudar os consumidores a reduzirem suas dívidas.
Em 1º de julho de 2021, uma parte da “Lei das Curas” (Cures Act) entrou em vigor, dando aos americanos a possibilidade de acessar seus dados de saúde e seguros por meio de uma chamada de API, que empresas como a Automate Medical estão viabilizando. Com isso, quem quiser negociar dívidas médicas pode dar a uma empresa negociante acesso a seus dados com um único clique, munindo esse serviço das informações necessárias para uma melhor atuação em nome do consumidor. Em relação aos prestadores de serviços de saúde, a “Lei da Transparência dos Preços” (PRICE Transparency Act) exigirá que os hospitais publiquem seus preços na Internet e a “Lei Sem Surpresas” (No Surprises Act) protegerá contra muitas cobranças médicas inesperadas – as duas leis dão ainda mais poder aos negociadores de dívidas médicas.
Startups como Goodbill e Resolve já estão se desenvolvendo nesse espaço, e nós enxergamos três produtos básicos iniciais que provavelmente definirão os vencedores da categoria:
– Marc Andrusko, deal partner de tecnologia financeira da a16z, e Daisy Wolf, partner de bio+health da a16z
Este mês, a Apple anunciou seus planos de lançar a função Tap to Pay no iPhone. Quando for lançado ainda este ano, o produto fornecerá uma ferramenta de pagamentos para microempresas e microempreendedores individuais. Os negócios desse segmento não precisarão mais de um terminal específico ou maquininha e poderão aceitar pagamentos usando o iPhone, o que reduz o custo e a complexidade do processamento de pagamentos (mais ainda do que fez a Square quando acabou com valores mínimos e taxas iniciais, por exemplo). Dessa forma, fica mais fácil para quem está começando um negócio ou uma atividade paralela ou para microempreendedores individuais começar a receber pagamentos usando seu iPhone. Comerciantes com presença on-line e off-line também poderão ver todos os seus pagamentos em um único lugar (como no Stripe), em vez de terem sistemas de pagamento separados para cada segmento.
É claro que a funcionalidade Tap to Pay não é a primeira solução de pagamentos contactless – sem contato – disponível para pequenas empresas nos EUA. Entretanto, tentativas anteriores não tiveram aceitação expressiva devido à resistência tanto do comerciante quanto do consumidor, criando uma clássica situação de ovo/galinha. Por algum tempo, o investimento para conscientizar o consumidor convencional e incentivar o uso desse método foi pequeno. As opções de pagamento com QR code do PayPal, Square e outros não demandavam leitora, mas exigiam que o consumidor acessasse um aplicativo de pagamentos associado para finalizar a compra. A Square testou o Pay with Square em 2012, que permitia que consumidores e comerciantes se conectassem via GPS e o pagamento fosse feito com um cartão vinculado. Mas os comerciantes ainda precisavam do ponto de venda (PDV) da Square e de conscientização do consumidor convencional. Muitas pequenas empresas aceitam pagamentos via CashApp, Venmo ou Zelle, mas usar cartão de crédito geralmente significa uma taxa de 3%.
Mas o momento certo chegou – as emissoras dos EUA recentemente emitiram um número enorme de cartões contactless para pagamento por aproximação. Além disso, a fase inicial da pandemia levou à adoção do método tap to pay porque clientes e comerciantes não queriam lidar com dinheiro.
Mas o que isso significa para o ecossistema de pagamentos?
Stripe é o primeiro parceiro de pagamentos da Apple (embora a Apple tenha planos de favorecer outras plataformas de pagamentos). Para a Stripe, esta também é uma grande jogada de distribuição. Agora, a empresa pode captar pagamentos off-line, além das transações on-line e, dessa forma, ter uma visão melhor e mais completa das transações de cada comerciante.
Para provedores de PDV, como Square/Block ou Toast, a funcionalidade Tap to Pay do iPhone não significa necessariamente perder negócios. Em primeiro lugar, o Tap to Pay acessa comerciantes que são, via de regra, menores do que o cliente da Square/Block hoje e que podem não querer registro ou dispositivo permanente. Para empresas maiores, no entanto, continuará fazendo sentido ter um registro separado e todas as funcionalidades e recursos – folha de pagamentos, gerenciamento de estoque, gerenciamento de turnos – que ele proporciona. Esses provedores de PDV são plataformas de pagamento baseadas em hardware e também podem fazer parceria com a Apple para atender ao segmento de microempresas e microempreendedores individuais.
Para a Apple, este produto é mais um passo rumo a um sistema de pagamentos de circuito fechado, além de facilitar para empresas de software mais verticais de setores off-line (como, saúde, assistência pessoal, beleza, serviços domésticos, etc.) receberem pagamentos on-line. Estamos entusiasmados para ver o ecossistema que esse desenvolvimento possibilita.
—Seema Amble, partner de tecnologia financeira da a16z